Falar de dinheiro é desconfortável?

Imagine que você está em uma mesa de bar rodeada de amigos onde a conversa está rolando solta. O clima é descontraído, com muitas risadas e os assuntos debatidos são os mais variados possíveis. De repente, pedem a conta. O garçom se aproxima e entrega a temida nas mãos daquele(a) que foi eleito(a) pela turma para fazer os “complexos” cálculos. O assunto ficou sério. É sobre dinheiro…

Ouve-se , então, um debate incessante: eu comi isto, bebi aquilo. Não pedi essa bebida. Fulano foi embora e não pagou. Paga a minha parte que depois acerto com você. Por que eu tenho que dividir igualmente se eu não comi coxinha? Não vou pagar os 10% do garçom pois fui mal atendido. Aqui não volto mais. Nossa, que caro…Fim das risadas.

Parece mentira, mas situações constrangedoras como esta são mais comuns do que se imagina. Eu, particularmente, não conheço quem nunca tenha presenciado ou vivido uma experiência parecida.

A grande questão é: por que as pessoas têm tanta dificuldade de falar e tomar decisões que envolvem dinheiro? Por que se sentem tão desconfortáveis? Responder a esta complexa questão tem sido um grande desafio para a área da Economia Comportamental . Estudos mais recentes, conduzidos por grandes economistas comportamentais como Richard Thaler e Dan Ariely, têm mostrado que nossas decisões sobre o dinheiro são menos racionais e cartesianas do que se imaginava, indo de encontro à economia clássica e racional de  Adam Smith, pai da economia moderna.

Richard Thaler, ganhador do prêmio Nobel de Economia em 2017, foi um dos primeiros economistas a considerar a economia e a psicologia como inseparáveis. Em sua linha de pesquisa, batizada de Economia Comportamental[1], Thaler defende que as pessoas nem sempre tomam decisões de forma racional e que suas escolhas são baseadas em questões subjetivas e culturais. Esse comportamento não racional traz à tona os aspectos emocionais que envolvem a tomada de decisão, que, inúmeras vezes , são essenciais para entender o comportamento humano.

Quer fazer um teste para medir o grau de desconfoto de alguém quando o assunto é dinheiro? Pergunte a um conhecido(a), amigo(a), parente, quanto ele ganha por mês e observe sua reação, sua resposta. Sinta-se à vontade para compartilhar a resposta nos comentários 🙂


[1] THALLER, Richard: Misbehaving – A Construção da economia comportamental . 1.ed- Rio de Janeiro: Instrínseca,2019

17 thoughts on “Falar de dinheiro é desconfortável?

  1. Samuel da Mata says:

    Gostei do texto. O assunto é sério e melindroso. Eu traria ainda outras vertentes. O problema não é o quanto você vai gastar, mas aquela sensação que foi abusado.
    É como uma saída pro motel, você sabe que vai transar, mas não sabe o quanto da sua essência ficará desgatada. Será sexo formal? terá violência ? Será comparado com alguém? Por-te-ão em condições vexatórias ou degradantes ?
    Na cama se exalta ou se mata o ego de alguém.
    No bar é da mesma forma, tem sempre um cretino tentando abusar de alguém. Seja entre os farristas ou o dono do bar. Depois de uma farra gastronômica você ama ou detesta o estabelecimento. Você sai sempre excluindo menralmente alguém de um novo encontro.

    Já me vi diversas vezes em situações gastronômicas abusivas, seja em roda de buteco ou em ciclos familiares. Hoje, às vezes prefiro bancar toda a festa que sofrer a afronta de um cretino. Quem nunca recebeu um convidado que chegou com mais tantos amigos não contabilizados ?
    Quem nunca viu alguém pedir um prato exótico e caro ao qual nem provou? Não viu levarem pra casa a garrafa de whisky ?

    A conta é muito importante na relações afetivas . É ali que se mede o quanto a sua amizade tem de mão dupla ou de uma única via. Já tive namoradas que pedia a sobremesa mais cara para medir a minha reação. Não sabia ela que alí se matava a relação.
    Acho até que as questões financeiras não são tão financeiras assim. São de fato uma demonstração de quanto se quer respeitar a essência ao outro individuo. Existe até receitas prontas no uso das finanças para acabar casamentos ou namoros. Deprecie os presentes que recebe, force-o a gastar acima do que pode, compare a sua vida com as mordomias da amiga. Digo até que o tesão acaba ja na escolha do hotel. Alí se define o que querem de você.
    Se alguém não respeita o seu suor, ao seu amor muito menos. As finanças comuns são como enfermaria, o cheiro revela quão próximo está o velório.
    Depois de três casamentos, a gente aprende a ver a correlação direta entre o amor e as finanças. Quando o abuso econômico surge é que o amor já está com os dias contados. É um processo irreversível. Acho até que é uma estratégia de descarte sem julgamento de mérito.
    Um dia, num site de relacionamento alguém me disse: Gostei muito de você, mas me diga, quanto você é mão aberta?
    Respondi: Lamento, mas entraste no site errado, o site das outas é outro, poste lá suas fotos s logo você saberá o quanto pagarão por você no mercado aberto.

    O amor fraterno, conjugal e familiar se mede em o quanto te querem ver economicamente fudido ou equilibrado.

    • Cassius Almada says:

      Olá Samuel. Seu texto é bem provocativo e captura exatamente a essência do meu post. O dinheiro está em tudo,desde as necessidade mais básicas até os desejos de uma sociedade que nunca está satisfeita. A questão é: por que as pessoas agem assim? A economia comportamental tenta responder a esss questões . Precisamos falar sobre esses temas, pois ifluenciam tanto no individual quanto no coletivo.

      Cordialmente,

      Cassius

      • Fatima Floresta says:

        Conversar sobre dinheiro é delicado. As pessoas não falam, acho eu, porquê ainda consideram um tabu, uma invasão de privacidade. Digamos, um assunto incômodo e pessoal. É embaraçante, por exemplo, para muitos, estar com um grupo em algum lugar, barzinho ou restaurante, e todos pedirem uma pizza, um tira gosto e você não pedir nada porque está duro é só tem o dinheiro para pegar um táxi e voltar para casa. Aposto que essa pessoa inventará uma estorinha para se justificar, dizendo que não passou bem é só ficará na água mineral. Eu, pessoalmente, nesse caso, ficaria em casa. Não sou muito de me abrir sobre minhas particularidades. Já outros não falam desse tema com receio das pessoas se achegarem por causa de sua conta bancária. Por isso, acho que a maioria tem amigos próximos a sua realidade financeira. Nesse caso, pode até surgir o papo. Um outro exemplo dificílimo de se comentar é sobre salário, e eu me incluo nessa. Pode ser até que se trate de uma questão cultural, hábito, ou mesmo de se sentir invadido numa área que é tão íntima e diz respeito da sua vida. Quem nunca ouviu um comentário do tipo, “ ele teve a cara de pau de perguntar quanto eu ganho”.

        • Cassius Almada says:

          Olá Fátima.

          Realmente, seu comentário é super pertinente. O dinheiro é , antes de mais nada, uma abstração, uma construção social. A maneira como as pessoas agem quando há dinheiro envolvido diz muito sobre sua personalidade e sua historia.

          Cordialmente.

          Cassius

    • Cassius Almada says:

      Ola Rodrigo, tudo bem?

      Obrigado por sua participação. Concordo com você. Se falar sobre dinheiro é um tabu, pergunto: o que você está disposto a fazer para contornar esta situação? Ou melhor, quais são os seus desconfortos?

      Estou disponível para conversar a respeito. Entre em contato

      Cordialmente,

      Cassius

    • Cassius Almada says:

      Ola Anna,

      Ótima observação. Realmente, o uso de comandas em restaurantes veio para contornar o problema e até vejo além: tal atitude dos estabelecimentos não só deixam as pessoas mais à vontade, como também mais solícitas.

      Cordialmente,

      Cassius Almada

  2. Soraia S Silva says:

    No Brasil faz parte da cultura ou e falta de educação financeira. Observo que muitos funcionários recebem seu salário e sacam o valor total não tem nenhum planejamento para o dinheiro, gastam em um dia, entendo que mesmo que não receba muito, se tiver um planejamento orçamentário e ajustes nos gastos e possível fazer mudanças importantes nas finanças.
    Educação financeira e muito importante e deveria ser matéria na escola desde cedo, mas não acontece isso, em algumas escolas esse assunto só e discutido mais tarde ou nem e abordado, com certeza faria uma grande diferença na educação, começando pelas crianças.
    Parabéns pelo belo texto coerente com nossa realidade!

  3. Rodrigo Ramos says:

    Excelente! Gostei muito da exemplificação através do cotidiano. Acredito que seja a melhor maneira de abordar um conteúdo desconfortável para muitos. Parabéns.

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